quarta-feira, 4 de junho de 2014

A Culpa é das Estrelas: “graças ao câncer percebi a delicadeza que é a vida”

Estrelado por Shailene Woodley e adaptado do livro homônimo de John Green, drama adolescente estreia esta quinta-feira (5)

A fisioterapeuta paulista Evelin Scarelli tem 26 anos, adora ganhar abraços apertados, tomar sorvete de chocomenta e tem pensado em se abrir novamente para o amor. Ela vive há três anos com o diagnóstico de câncer de mama e, a convite do iG, topou assistir ao filme e comentar a história do ponto de vista de um paciente oncológico
Se você está no time dos fanáticos por John Green e seus olhos brilham quando o assunto na roda é o “A Culpa é das Estrelas”, aperte os cintos e já separe seu kit “choro descontrolado” (que inclui, às meninas, uma boa maquiagem a prova d'água).
Quando recebi o convite do iG Jovem para assistir ao filme, minha reação foi lembrar automaticamente do meu primeiro encontro com história quando abri o livro de capa azul e enormes nuvens. Lembrei, principalmente, dos dias em que não consegui prosseguir a leitura por achar que não teria capacidade de encarar o final da historia.
Arquivo pessoal
Evelin Scarelli é fisioterapeuta, tem 26 anos e há três convive com o diagnóstico de câncer
Confesso: passei noites sem dormir querendo mudar a realidade do romance. Parece confuso, mas vejo esse livro com diferentes olhos e você entenderá o motivo. Como qualquer primeira conversa exige uma apresentação, peço um minutinho da sua atenção para contar quem somos nós: eu, Evelin, e minha ferida ainda sem nome.
Olá. Eu sou a Evelin, tenho 26 anos e essa é a minha ferida: a de conviver intensa e diariamente com o diagnóstico de câncer desde os meus 23, quando entrei inesperadamente para as estatísticas dos pacientes oncológicos. Dentro de toda essa montanha russa emocional, perdi meus cabelos, passei por algumas longas cirurgias, dias e mais dias de radioterapia, algumas sessões quimioterápicas e também fiz várias visitas ao pronto socorro, decorrentes de alguns efeitos de todo o tratamento. Incrível como conseguimos resumir alguns meses em uma porção de linhas, não é mesmo? Algumas coisas que Hazel Grace, personagem principal do filme, e eu temos em comum. Além de um humor ácido e bem resolvido, é claro.
Imagens do filme "A Culpa É das Estrelas". Foto: Divulgação
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Agora, mergulhando de cabeça nessa impressão do filme, alguém sabe me dizer se o John conviveu com alguém diagnosticado? Porque ficou difícil resumir uma parte favorita no filme. Tudo, praticamente tudo, se mistura lenta e completamente a todos os processos que vivenciei com o diagnóstico – e talvez seja essa a razão da minha fuga em relação à leitura do livro. O “praticamente” ficou bem fácil de entender, não é mesmo? Já que faltam garotos como o galã Augustus Waters no mercado (nota: se você tem um amigo com o estilo dele, por favor, avise! Meu e-mail está no final do texto hehe).
Arquivo pessoal
Ela é autora dos blogs "Lenço Cor de Rosa" e "Minha Vida Pós-Câncer"
Então se dentro de você ainda exista uma leve preocupação com a adaptação do romance, você já pode voltar a respirar tranquilamente. Nunca um filme pareceu tão fiel ao livro, o que inclui, principalmente, os diálogos. E ainda digo mais: se no livro, os personagens de Hazel e Gus são apaixonantes, espere só até conferir a dupla de atores Ansel Elgort e Shailene Woodley na tela. Preparem os seus corações, a química entre eles é de tirar o fôlego!
Mas preciso dizer que eu, paciente oncológica, me sinto representada pela Hazel Grace. Desde a mania engraçada de incorporar os termos médicos dentro de qualquer conversa (temos bastante tempo para aprendê-los), passando por todas as sensações, pensamentos e inseguranças no decorrer de cada processo do tratamento e até com o sofrimento que isso causa em nossos pais, familiares e amigos. Essa é uma das questões mais complicadas sobre o câncer: a certeza de que algumas coisas independem da sua vontade. A mais complicada, definitivamente, é a de tentar tirar da cabeça essa história de não de ser uma “bomba-relógio”.
Arquivo pessoal
"Estou a ponto de perder as contas de quantas oportunidades deixei passar por esse receio de me permitir se sentir apaixonada"
Se até o sofrimento dos familiares e espectadores desse “mundo” do câncer é bem real, imagine só essa parte de “soltar a trava” do medo e se permitir viver um grande amor. É nessa parte que me distancio um pouco da personagem. Eu, aos 26 anos e sem um diagnóstico de câncer terminal, estou a ponto de perder as contas de quantas oportunidades deixei passar por esse receio de me permitir se sentir apaixonada.
O motivo é bem simples, visto de fora do meu prisma: vi o quanto já dei trabalho por toda essa história e saber que causar esse mesmo “sofrimento” a um namorado me deixa um pouco desnorteada em relação ao assunto. Não me culpo por essa insegurança, nem sempre as coisas são fáceis dentro do câncer – mas me culpo pelas oportunidades que perdi.
Divulgação
Gus (Ansel Egort) e Hazel (Shailene Woodley), protagonistas de "A Culpa É das Estrelas"
Voltando ao filme, sem mais detalhes para não estragar a surpresa! Grande parte de vocês já conhecem o livro, mas não quero influenciar essas primeiras impressões frente à telona (até porque não tenho a menor dúvida quanto a sair da sala já com aquela baita saudade dos personagens). E quanto aquele papo da maquiagem, meninas, ele é beeem sério. Levem lenços!
E é isso. Graças a essa mesma oportunidade de poder escrever sobre a minha impressão do ponto de vista “paciente” (e até desabafar um pouquinho), deixo registrado a maior lição que o nosso John Green me ensinou dentro dessas 288 páginas – muito bem escritas, por sinal: quanto realmente vale o tempo de uma vida?
Dentro da minha realidade, abro um também curto sorriso e agradeço pela oportunidade de conseguir perceber, graças ao câncer, a delicadeza que é todo esse processo chamado vida. Sai do cinema extremamente emocionada e passei algumas longas horas assim, meditando também sobre a importância que as pessoas têm na minha vida. Quanto tempo ainda tenho, o que fiz por mim e o que ainda posso fazer? Não são questões que sei responder com uma certa exatidão. Só sei que cheguei à conclusão de que ainda não vivi e descobri o bastante...
E você, caro leitor, de quanto tempo ainda precisa para enxergar o valor da SUA vida? Se ainda está de olhos abertos, então ainda há tempo...
O.K?

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