Neurocientista Suzana Herculano-Houzel explica como o afeto familiar determina as reações dos filhos diante do estresse, conflito e frustração
O cérebro não nasce pronto. Além da genética, as
experiências vivenciadas nos primeiros três anos de vida são
determinantes – até mais do que os genes - para moldar o funcionamento
cerebral diante de situações estressantes, desafiadoras e frustrantes.
Quem avisa é a neurocientista Suzana Herculano-Houzel,
uma das principais estudiosas da “mente das crianças” do País. Segundo
ela, dados científicos comprovam que o carinho dos pais, recebido na
primeira infância (período entre 0 e 5 anos), é o grande responsável por
reações cerebrais - às vezes só manifestadas na vida adulta.
Thinkstock/Getty Images
"Apesar de ser muito mais
marcante na infância, o carinho sempre influencia. Nunca é tarde para
começar", afirma a neurocientista Suzana H. Houzel
Em palestra realizada na sede da Fundação Maria Cecília Souto Vidigal (entidade que elabora programas voltados à população infantil), em São Paulo, Suzana explicou como as doses de afeto são receitas de sucesso para arquitetar um cérebro sadio no presente e no futuro. “Receber ou não carinho modifica para sempre como o cérebro vai reagir diante do estresse e da frustração”, afirma.
Leia as principais conclusões da especialista, que é
autora de cinco livros, professora e coordenadora do Laboratório de
Neuroanotomia comparada da Universidade Federal do Rio de Janeiro
(UFRJ):
A formação do cérebro
“As crianças não são adultas por dois motivos principais: o primeiro é que elas não têm a experiência trazida com o passar dos anos. O segundo fator é o cérebro infantil. O órgão não nasce pronto, é menor e mais leve do que o cérebro de um adulto. Até o terceiro ano de vida, é o período em que o cérebro mais cresce e ganha peso. Uma das explicações para o crescimento cerebral é que, neste intervalo de anos, há maturação das conexões entre os neurônios, o que faz o peso da massa encefálica aumentar, ficar mais densa. Este processo é determinante para o bom funcionamento do cérebro.
“As crianças não são adultas por dois motivos principais: o primeiro é que elas não têm a experiência trazida com o passar dos anos. O segundo fator é o cérebro infantil. O órgão não nasce pronto, é menor e mais leve do que o cérebro de um adulto. Até o terceiro ano de vida, é o período em que o cérebro mais cresce e ganha peso. Uma das explicações para o crescimento cerebral é que, neste intervalo de anos, há maturação das conexões entre os neurônios, o que faz o peso da massa encefálica aumentar, ficar mais densa. Este processo é determinante para o bom funcionamento do cérebro.
Durante este amadurecimento cerebral, a criança tem uma
capacidade de aprendizado rápida e impressionante. É o período em que
elas aprendem a detectar sons, enxergar e constituir habilidades, das
mais variadas. Por exemplo: todos nascemos com plena capacidade de
aprender qualquer idioma. Capacidade esta que vamos perdendo ao longo da
vida.”
Influências na formação cerebral
“Este período de crescimento do cérebro é chamado de
período crítico. Todo e qualquer processo de aprendizado, sendo criança
ou adulto, exige a repetição, por meio da tentativa e do erro. Mas nos
primeiros anos de vida, o cérebro compreende mais rápido como reagir,
sem precisar de tantas tentativas assim. Para criar um comportamento e
uma reação padrão diante de algum estímulo - que pode ser um barulho, um
estresse, uma sensação de medo, de solidão ou de felicidade - não é
preciso repetir tantas vezes.
Neste contexto, é claro que a genética influencia em
nossas habilidades e características. Mas a vivência da criança e os
exemplos que ela tem dentro de casa são fundamentais para a criação
deste comportamento. A capacidade de linguagem de uma criança, por
exemplo, é intimamente ligada ao vocabulário da mãe, às palavras que ela
fala com o bebê, só para citar um exemplo da influência do ambiente no
desenvolvimento do cérebro infantil.”
O poder do carinho
“Sabendo desta influência tão significativa do exemplo no
período de aprendizagem, o estímulo dos pais dados à criança durante a
primeira infância é uma importante ferramenta para o desenvolvimento de
habilidades. Não só isso. O comportamento também é moldado nesta fase.
Se a mãe faz de qualquer probleminha um problemão, o cérebro da criança
aprende a reagir de forma estressada a qualquer situação. Isso significa
que o perfil de reação ao estresse na fase adulta é aprendido e traçado
na infância. São vários fatores que moldam esta reação cerebral. Pode
ser influenciada, negativamente, por violências físicas ou verbais
vivenciadas logo nos primeiros anos de vida. Uma mãe que grita demais ou
age em descontrole passa a mensagem para o filho de que ele deve agir
desta maneira quando não conseguir fazer alguma coisa.
A boa notícia é que o carinho também molda o cérebro. São
várias pesquisas científicas que compravam o carinho físico, o toque e o
contato como um moldador cerebral que torna a criança mais hábil e com o
sistema de proteção orgânico mais forte. Isso acontece por causa da
ocitocina, um hormônio altamente influente na formação cerebral, que é
produzido durante a amamentação e liberado também no abraço, no beijo,
na massagem. A ocitocina é responsável por fazer com que o cérebro
produza a capacidade de vínculo e acalma todas as partes cerebrais
acionadas em situações estressantes. O que é uma ótima prevenção da
ansiedade e outros transtornos de comportamento que, às vezes, só se
manifestam na vida adulta. Receber ou não carinho modifica para sempre
como o cérebro vai reagir diante do estresse e da frustração. Mas apesar
de ser muito mais marcante na infância, o carinho sempre influencia.
Nunca é tarde para começar.”
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