João Pedro, 9 anos, aprendeu com o irmão Jorge, 14, a gostar de Skank e Paralamas do Sucesso. Foto: Divulgação
Causas e consequOs especialistas ainda não conseguem afirmar com clareza
quais são as causas do autismo - condição que não é detectada por exames
no pré-natal e, na maior parte das vezes, só se manifesta a partir dos
dois anos de idade. Mas os estudiosos sabem que os principais sintomas
do espectro autista - dificuldade na fala, na comunicação, de fazer
contato visual e estabelecer relação com o entorno - contribuíram para
disseminar duas informações equivocadas e perigosas sobre eles.
“Um dos maiores perigos de acreditar que o autista é
incapaz de afeto e que não vive no mesmo mundo que o nosso é que, assim,
ele acaba subestimado e diminui as chances de desenvolvimento da
criança”, alerta a psicomotricista e pedagoga Eliana Boralli Mota,
fundadora da AUMA (Associação dos Amigos da Criança Autista).
“Eu trabalho há 24 anos na área e conheci autistas de
todos os lugares: Brasil, América Latina, Europa e Japão. Em todos os
casos, sempre encontrei neles o idioma universal do afeto. Mas é preciso
um trabalho para ajudá-los a organizar estas sensações e então
manifestá-las", orienta Eliana.
Preconceito no consultório
Os potenciais afetivos e de capacidades dos autistas são
minados pelo preconceito e pela falta de informação presentes,
inclusive, em parte dos psicólogos, psiquiatras e neurologistas. Eliana,
por exemplo, antes de virar especialista na área, levou a filha
Nathália, na época com três anos, à clínica de um dos nomes mais famosos
do tratamento de autistas dos anos 1990.
“O médico disse que minha filha nunca seria capaz de
falar. Sentenciou que, em 15 anos, ela estaria internada em uma clínica,
com camisa de força”, lembra a mãe que ficou incomodada com a rapidez
de um prognóstico tão severo, dado após um único contato com a menina.
“Eu não me conformei com aquelas informações e fui atrás
de outras possibilidades. Hoje, a Nathália está com 27 anos, é
alfabetizada, uma pessoa cheia de vontades e bem temperamental. Tenho um
orgulho danado quando a vejo expressar sensações das mais elaboradas.
Ela sempre diz ter saudade de mim", diz a mãe que atua para levar estas
possibilidades de convívio afetivo dos autistas a outros pais.
Arquivo pessoal
João Pedro foi diagnosticado como portador do transtorno autista aos dois anos de idade
Sensações aguçadas
As descrições científicas sobre os autistas confirmam que
o caminho entre "sentir" e "manifestar" é mais complicado para eles do
que para os não portadores do transtorno. De acordo com as descrições
dos catálogos médicos “há modificação na captação e organização
sensorial da audição, visão, paladar, olfato e tato”. Estas alterações
comprometem a capacidade de imitação, percepções, coordenação motora e
integração por vias sensoriais.
“A maior dificuldade do autista é se colocar no lugar do
outro", define a fonoaudióloga Aline Kabarite, diretora do Instituto
Priorit - entidade que oferece atendimento multifatorial (psicologia,
dança, esporte, teatro e terapia) a cerca de 100 crianças e adolescentes
autistas.
Aline explica que as sensações para o autista são, em
alguns casos, muito mais aguçadas. “Às vezes, um som que passa
despercebido para outras pessoas provoca um incômodo terrível nos
autistas. Um abraço não desperta, imediatamente, prazer, e sim,
desconforto”, informa.
Por isso, explica ela, o trabalho com os autistas tem
como objetivo fazer com que eles fiquem adaptados a uma forma de
linguagem que torne mais fácil expressar as sensações e receber essas
informações.
“É um refinamento social e é importante que os pais
reconheçam as formas de afeto que inicialmente podem estar ocultas”, diz
ao citar exemplos. “Enquanto a criança autista não reconhece como
processar o carinho da mesma maneira que nós estamos acostumados, para
ela fazer um desenho, preparar um café da manhã ou colocar a mão no
ombro podem ser maneiras mais elaboradas de expor suas sensações
afetivas.”
ências