sábado, 22 de janeiro de 2011

E quando a invejosa sou eu?


A invejosa tem uma característica singular - é sempre a outra. Todo mundo admite ter algum defeito: preguiça, falta de organização, pavio curto, orgulho grande. Nem que seja o ambíguo "perfeccionismo". Mas aceitar e dizer em alto e bom som que se tem inveja é coisa rara. Inveja confessada, só mesmo a tal da "inveja branca", expressão que eximaria o invejoso do atributo destrutivo e sombrio que necessariamente acompanha o sentimento. Acontece que todos, nem que seja apenas em determinado momento da vida, somos invejosos. Aliás, segundo Freud, é só por conhecermos nossa própria inveja que conseguimos reconhecê-la no outro, como explica a psicanalista Rita Maria Manso de Barros, professora da UERJ e autora de uma tese sobre o tema. Mas por que sentimos inveja? E o que podemos fazer para reconhecer quando o invejoso somos nós?
"Esse sentimento está necessariamente ligado a uma sensação de impotência", explica a psicanalista. "A inveja aparece quando reconhecemos em alguém uma qualidade que gostaríamos de ter, mas acreditamos que não temos, ou não podemos ter", diz. Se parasse por aí, seria quase uma admiração. Mas quando, por causa de nosso sentimento de impotência, essa admiração vem acompanhada daquela vontade sofrida de destruir o bem alheio, isso é inveja. "A dificuldade de se admitir esse sentimento vem exatamente do fato de que isso seria admitir uma falta ou impotência que acreditamos ter".
Inveja dói, e acontece com todo mundo
A vontade de destruir que acompanha a inveja é muito facilmente observada em crianças que, por exemplo, quebram o brinquedo do amiguinho. Nos adultos é mais discreta e costuma aparecer principalmente por meio da fofoca. Como todo mundo sabe que não é perfeito, todo mundo está sujeito a invejar quando se depara com alguém que tem exatamente aquilo que nos falta.
Nessa hora, o que acontece não é segredo: não dá para segurar os comentários depreciativos sobre aquilo que a gente no fundo queria tanto. E logo Carolina Dieckmann não é tão bonita assim, Gisele Bündchen torna-se uma magrela nariguda, Eike Batista enriqueceu economizando no corte de cabelo, a colega é promovida por ser puxa-saco e todos os homens reparam na vizinha porque, também, com uma saia daquele tamanho...
"É natural olhar para algo que o outro tenha conquistado e se dar conta de que gostaria de possuir ou conquistar também. É uma forma também de defesa do próprio fracasso - ao invés de olhar para si, aponta-se o outro de forma destrutiva, deturpada", afirma a psicoterapeuta Márcia Homem de Mello. Esse olhar para o outro é uma das características do sentimento. "Dessa forma, o invejoso deixa de olhar para si mesmo", explica Rita Maria Manso.
Mulher x inveja
Apesar de o sentimento ser comum aos dois gêneros, a inveja costuma ser mais associada as mulheres. Isso tem menos a ver com qualquer ideia de natureza feminina do que com sua criação social: a inveja feminina deve muito ao fato de que, ao contrário do que acontece com os homens, os valores reservados às mulheres em geral não poderem ser adquiridos simplesmente através do próprio esforço. "A mulher sente que tem que ser bonita, elegante e, ainda no século 21, as menininhas são criadas ouvindo que precisam ter um marido", afirma a psicanalista. E muitas dessas coisas dependem de sorte e do olhar do outro. Como evitar, então, invejar uma mulher que nasceu com o que você não tem? "Algumas mulheres já se livraram disso pelas próprias mudanças sociais", diz Rita Maria. Mas da inveja ninguém está totalmente livre. "Essas mulheres, como os homens, estão mais sujeitos a invejar situações de poder".
Sou invejosa! E agora?
Olhar para si e reconhecer um sentimento de inveja é um grande passo. "Quem sente vergonha é porque está com a inveja ruim, aquela que prejudica, que destrói o outro e a si mesmo", diz Márcia Homem de Mello. E que ninguém se engane, porque sentir inveja dói. Mais no invejoso do que no invejado, independentemente da crença no olho-gordo de cada um. Perceber o sentimento é o começo da melhor forma de trabalhá-lo e até usá-lo a seu favor. "É um processo de olhar para si e descobrir quais são as qualidades que gostaria de ter e então trabalhar para consegui-las", diz Rita. Claro que isso envolve também muita aceitação. "A pessoa terá que usar seu discernimento para aceitar o que pode correr atrás e o que não adianta. Não adianta querer ser filha da Rainha Elizabeth, porque é impossível". Mas, com honestidade e realismo, no fim vale a sabedoria popular: não inveje, trabalhe.





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