Vítimas do Golpe de 1964 sofrem ao ver nas ruas, 51 anos depois, pedidos de intervenção militar
Rio - Perplexidade, lamento e indignação são sensações de sobreviventes e parentes de vítimas da ditadura militar ao falar da data que marca o aniversário de 51 anos do Golpe de 1964, hoje. A dor, agora, não tem relação apenas com o que foi enfrentado no passado. Ela fica mais forte quando eles encaram — pela primeira vez em 30 anos de redemocratização — grupos que saem às ruas com faixas e pedidos de intervenção militar e até celebrando a ditadura.
Em meio à resistência contra o regime, Suzana Lisbôa perdeu o marido, Luiz Eurico, assassinado sob tortura em 1972 e enterrado como indigente. Na busca pelo corpo do marido, tornou-se uma das principais militantes na busca pelas circunstâncias das mortes e de Justiça às vítimas.
Para Suzana, falar das manifestações que saúdam a ditadura é difícil. “Abdiquei de muita coisa, arrisquei a vida. Não perdi só o meu companheiro, mas praticamente todos os amigos e não me arrependo de ter enfrentado a ditadura. O sentimento que eu tenho é de que essas pessoas não têm conhecimento do que aconteceu.”
Suzana acha que a esquerda tem parcela de culpa na existência desses movimentos. “Tenho indignação enorme com setores da esquerda que nos calaram todos esses anos dizendo que estávamos desestabilizando o governo ao tentar ir além na questão na impunidade e da memória”, afirma.
A historiadora da Fundação Getulio Vargas Dulce Pandolfi também foi vítima dos porões do regime. Torturada no DOI-Codi do Rio, ela acredita que a resistência dos governos em punir os torturadores e a falta de educação sobre o assunto deixou como consequência a ausência de reflexão sobre a época. “É lamentável, e isso tem a ver com o processo político de tentar botar sempre para debaixo do tapete e não reavivar a memória. Tortura é um crime de lesa-humanidade”, criticou.
Anacleto Julião, filho do líder das Ligas Camponesas Francisco Julião, também vê lacunas na educação do período. “De certa maneira, foi uma surpresa porque não pensei que a burguesia fosse tão ignorante. Mas a democracia brasileira ainda é frágil, capenga e com pessoas predominantemente reacionárias, que querem seguir uma política neoliberal contra o favorecimento das classes mais pobres”, defendeu.
Na esteira de críticas às manifestações pró-ditadura, o deputado federal Wadson Ribeiro (PCdoB-MG) apresentou no início da semana um projeto de lei que criminaliza a apologia ao retorno da ditadura militar ou a pregação de novas rupturas institucionais. “Quem clama pela violação das regras democráticas do Estado de Direito, o retorno da ditadura militar ou a pregação de novas rupturas institucionais não deveria estar nas ruas”, afirma Wadson.
Elogios e estímulos ao golpe
O Clube Militar do Exército no Rio não deixou de lado ontem sua tradicional comemoração do 31 de março, com um almoço para cerca de 180 pessoas. No site da instituição, um texto do presidente do clube, Gilberto Pimentel, celebrou o golpe do passado estimulando as correntes golpistas do presente.
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