Novas tecnologias permitem aos pais cercar seus filhos com emails e telefonemas e não deixam a criança aprender a lidar com o sentimento
A saudade sempre esteve ao nosso lado, mas agora essa emoção universal está sendo complicada pelos pais, que utilizam as novas tecnologias para cercar os seus filhos, ligando, escrevendo e mantendo contato permanente com eles.
Um dos principais autores da política da Academia Americana de Pediatria sobre prevenção de saudade destacou que muitos calouros chegam à faculdade sem nunca terem se afastado de suas famílias. "Os pais fizeram um ótimo trabalho ao proteger os seus filhos, impedindo que eles saíssem de suas vistas", afirmou o Dr. Edward Walton, diretor da divisão de emergência pediátrica do Hospital William Beaumont in Royal Oak, Michigan.
Christopher Thurber é psicólogo escolar na Academia Phillips Exeter,em New Hampshire, e autor da política da Academia. Ele realizou diversas pesquisas a respeito de saudade com crianças colocadas em ambientes que variavam de colégios internos e acampamentos a faculdades e hospitais. Segundo eles, três fatores costumavam causar as sensações mais severas de saudade entre as crianças.
O primeiro é simplesmente temperamental: algumas crianças costumam ter mais problemas com qualquer situação nova. O segundo envolve experiências anteriores. Crianças pequenas acostumadas a ficar longe de casa se saíam melhor do que as mais velhas que estivessem longe de casa pela primeira vez.
Entretanto, o terceiro fator causador da saudade pode surpreender muitos pais: sua própria expressão de ansiedade em relação à separação. Segundo Thurber, esses são "os pais que expressam ambivalência – pais amáveis e bem intencionados que dizem: 'divirta-se no acampamento, eu nem sei o que vou fazer sem você por aqui'".
Pequenos pacientes
Thurber afirmou que esses pais incutem preocupações em seus filhos quando descrevem suas próprias dúvidas. Ao invés disso, eles devem reconhecer que pessoas que se amam sentem a falta umas das outras quando estão distantes, demonstrando a confiança de que é possível lidar com isso e aproveitar o tempo que estiverem longe.
Eu descobri a pesquisa sobre saudade quanto estava procurando informações sobre acampamentos de verão. Ela chamou minha atenção tanto como pediatra quanto como mãe.
Eu nunca atuei como médica nesses acampamentos, mas amigos e colegas que já fizeram esse trabalho falam com carinho desses lugares. Segundo me disseram, eles atendem muitos casos de problemas na pele. Picadas de inseto, alergia a urtiga, arranhões, cortes e infecções cutâneas. Casos de infecções virais e gargantas inflamadas.
Mas alguns dos pequenos pacientes que vão à enfermaria só estão com saudade de casa. Dores inexplicáveis ou preocupações exageradas em torno de uma picada podem ser os primeiros sinais.
Além de uma série de reclamações físicas, a saudade pode se revelar como raiva ou desorientação. Os funcionários dos acampamentos precisam reconhecer e se habituar à saudade, explicando que todos passam pelo mesmo sentimento.
Acima de tudo, os especialistas aconselham a não fazer um "acordo de busca". Nunca prometa ao seu filho que se algo o incomodar você estará lá para buscá-lo mais cedo.Separação longa
O que os pais podem fazer para preparar seus filhos? Fale sobre a saudade e sobre como lidar com ela antes de se separar de seu filho. Pratique a separação – fins de semana na casa de avós, por exemplo, durante os quais você liga ou manda mensagens esporádicas. Essa experiência pode ajudar as crianças a se prepararem para períodos mais longos e auxiliar os pais a julgar qual o momento certo para a primeira separação mais longa.
"As pessoas cometem esse erro o tempo todo", afirmou Walton. "Todas as crianças vão perguntar: 'mas e se eu ficar com saudade?'. Com um acordo desse tipo, você está dando a entender que não confia na capacidade do seu filho de lidar com um sentimento tão normal quanto esse."
Esses acordos deixam os pais com apenas duas opções, e ambas são prejudiciais. Se você for buscá-lo, seu filho irá perder a oportunidade de aproveitar tudo que a experiência longe de casa pode proporcionar e de aprender a lidar com a separação. Se você não for buscá-lo, não estará cumprindo sua promessa.
Walton prossegue, dizendo que caso seu filho o pressione, você deve se colocar à disposição para conversar com ele sobre diferentes formas de lidar com a separação. Além disso, pode ser uma boa ideia criar suas próprias estratégias para lidar com isso.
"Muitas vezes quando falamos de saudade, falamos sobre a falta que sentimos de nossos filhos", afirmou Walton.
"Nós nunca deixamos de sentir saudade das pessoas que amamos", afirmou Thurber. Pais e filhos podem aprender a compreender a saudade como um reflexo do amor.
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