Sem identificação de 41% das vítimas, parentes não tiveram corpos para enterrar; para mãe, morte de filho é 'irreal, pesadelo diário'
O 11 de Setembro de 2001 deixou 2.753 mortos nas Torres Gêmeas do World Trade Center (WTC), em Nova York. Mas, desse total, apenas 1.630 tiveram seu corpo ou restos mortais identificados. Isso significa que as famílias de 41% das vítimas nunca puderam realizar um funeral e homenagear seus familiares com uma lápide.
“Não considero meu filho morto; eu o considero um desaparecido”, diz Sally Regenhard, que perdeu seu filho, Christian, de 28 anos. Ele estava se formando como bombeiro e provavelmente morreu no desmoronamento das torres.
“É muito mais difícil para as famílias que nunca tiveram os restos mortais de seus parentes identificados. É uma morte irreal, um pesadelo diário. Não há lápide nem cemitério para visitar. É como se não tivesse acontecido”, afirma Sally.
Nas semanas seguintes aos ataques, Sally esperou por um contato, um telefonema, qualquer sinal de seu filho. Ela telefonou e visitou dezenas de hospitais na esperança de encontrá-lo. Até que, sem nenhuma informação, teve simplesmente de se resignar com a perda. “Não tinha coragem de desistir. Juntamente com a minha filha, mantivemos as esperanças até o fim. Mas Christian nunca voltou para casa.”
Dos mais de 2.750 mortos, menos de 300 corpos foram encontrados inteiros nas mais de 1,5 milhão de toneladas de destroços deixados pelo colapso do WTC. Ao todo, mais de 21,8 mil pedaços de ossos, cartilagem, órgãos e pele foram compilados na região do chamado Marco Zero (local onde ficavam as torres). Desses fragmentos, mais de 6 mil eram suficientemente pequenos para caber em tubos de ensaio.
A explosão dos aviões contra as torres e seu colapso foram tão violentos que a junta médica trabalhando na identificação dos restos mortais chegou a encontrar 200 pedaços de uma única pessoa.
“ Ela saltou. Ela não queimou viva. Ela não virou poeira. Nada pode ser mais doloroso do que perdê-la, mas não saber como eu a perdi era ainda pior
“Explosões de aviões e a queda de edifícios no passado nunca impossibilitaram o reconhecimento de corpos. A queda das torres do WTC, porém, transformou tudo o que não era ferro em poeira homogênea, incluindo os corpos”, diz o relatório elaborado pela junta médica para a prefeitura de Nova York.
Richard Pecorella perdeu a sua esposa, Karen Juday, no 11 de Setembro. Ele conta no documentário “9/11 The Falling Man” (“11/09 O Homem em Queda”, em tradução livre) que ficou absolutamente obcecado em encontrá-la nas fotos das pessoas espremidas nas janelas dos andares acima do impacto do avião na Torre Norte, a primeira a ser atingida. Dias depois dos atentados, Richard reconheceu sua esposa em uma queda livre dos últimos andares do WTC.
“Devia estar tão quente lá em cima que não tinha alternativa, ou você queimava vivo ou ia embora, de forma rápida. Você sufocava até a morte ou pulava. Eu considero muito corajoso Karen ter pulado. Quando vi aquela imagem, acalmei-me. Então foi isso que aconteceu. Eu finalmente tinha alguma informação. Foi assim que ela morreu. Ela saltou. Ela não queimou viva. Ela não virou poeira. Nada pode ser mais doloroso do que perdê-la, mas não saber como eu a perdi era ainda pior”, conta.
Sally lamenta não ter tido a mesma sorte. “Não tive nenhum contato com meu filho na manhã do 11 de Setembro. Ele estava trabalhando e não poderia entrar em contato comigo. Mas eu considero criminoso o fato de a prefeitura de Nova York nunca ter podido me informar onde exatamente estava o meu filho quando ele morreu. Na Torre Sul, na Norte? Subindo as escadas? No saguão? Não sei absolutamente nada sobre a sua morte”, reclama com lágrimas nos olhos.
Cerca de seis anos depois dos atentados, Sally se mudou da casa onde criou seus filhos para um apartamento menor. Assim como ela nunca tinha desfeito o quarto de Christian depois da sua morte, reservou um quarto no novo apartamento especialmente para guardar os objetos e os livros de seu filho.
“É o quarto mais bonito de todo o apartamento. É todo pintado de branco, e os objetos de Christian estão todos ali. Simplesmente não consigo me desfazer deles. Quando eu quero estar com ele, eu vou ali.”
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