sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

Pior discriminação é a da mulher, diz presidenta de instituição

3ª mulher à frente da principal instituição de ciência do País, a SBPC, Helena Nader admite preconceito na academia, mas aposta em mudança
À frente de uma das mais importantes associações de promoção da ciência no Brasil, a professora Helena Nader sabe que é uma exceção. Para ela, por ser mulher, sua responsabilidade no cargo de presidenta da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) é ainda maior. “Meus colegas me deram a honra de estar nessa posição e como poucas mulheres chegaram até aqui, a responsabilidade é maior ainda”, diz.
Professora da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), onde estudou ciências biomédicas, Helena é a terceira mulher a ocupar o posto máximo da SBPC. Criada em 1948 para difundir a ciência, a associação conta com mais de 6 mil pesquisadores associados. Helena faz parte do grupo desde que ainda era uma universitária e se apaixonou pelas artes de ensinar e pesquisar. “Se eu tivesse que repetir a minha vida, faria tudo de novo, igualzinho”, garante.
Terceira mulher a assumir presidência da SBPC, Helena Nader acredita que as mulheres se privam de melhorar a carreira em muitos casos
Doutora em biologia molecular pela Unifesp e pós-doutora pela University of Southern California, dos Estados Unidos, Helena também possui cadeira na Academia Brasileira de Ciências. Atuou como pró-reitora de graduação e de pesquisa da Unifesp e trabalhou como professora visitante em Chicago e Nova York (EUA), Milão e Modena (Itália).
Tanta dedicação ao trabalho, segundo ela, só foi possível graças ao apoio que recebeu do marido e às suas próprias filosofias de vida. “Algumas decisões são de foro íntimo e algumas pessoas não teriam a tranquilidade que eu tive em assumi-las. A mulher é criada dentro de uma filosofia de que é ela quem tem de fazer determinadas coisas”, pondera.
Contra cotas como políticas afirmativas de gênero, por acreditar que as mulheres têm mérito e condições suficientes para assumirem postos de chefia, Helena é otimista e acredita que o futuro será diferente. Em pouco tempo.
Professora, a senhora está em uma posição rara hoje: a de uma mulher liderando um cargo importante para a ciência brasileira. Como se sente diante dessa missão?
Helena Nader: Eu tenho um orgulho muito grande de estar ocupando essa posição, Mas, apesar de as mulheres estarem cada vez mais se titulando e produzindo ciência, há um número pequeno mesmo que chega a posições de chefia. Na SBPC, eu sou a terceira. A sociedade já teve como presidente homens como Anísio Teixeira, então minha responsabilidade é grande. Fui vice durante quatro anos e me indicaram para a presidência agora. Meus colegas me deram a honra de estar nessa posição e como poucas mulheres chegaram até aqui, a responsabilidade é maior ainda.
 Por que a senhora acha que foi escolhida?
Helena: Desde quando comecei minha vida acadêmica, sempre lutei muito para fazer ciência de alta qualidade, com a mesma expressão e importância do que é feito em qualquer lugar do mundo. Nunca me passou pela cabeça que um dia estaria à frente dessa instituição. Fui pró-reitora de pós-graduação e de pesquisa da Unifesp e acredito que os reitores me convidaram pela minha capacidade técnica. Acho que, dessa vez, ocorreu o mesmo.
A senhora acredita que ainda existe preconceito na academia e na ciência em relação à capacidade feminina?
Helena: Infelizmente, ainda existe discriminação sim. Não gosto de acreditar nisso, mas acontece. Agora, pior é própria discriminação da mulher, que se bloqueia e não se permite ser mais agressiva no sentido de almejar determinados cargos e ir à luta. Há um estigma, mas acho que isso está mudando. Qualquer mudança é lenta. Eu gostaria que fosse mais rápida.
 A senhora acredita que essa desigualdade de gênero na academia vai acabar em pouco tempo? O que poderia fazer para acelerar esse processo?
Helena: Evoluímos bem, mas não o suficiente. Não gostaria, de verdade, que essa aceleração ocorresse por causa de ações afirmativas. Sou totalmente a favor de ações afirmativas para a entrada do negro e do índio na universidade, porque eles foram excluídos, não tiveram o mesmo acesso à educação. Com as mulheres é diferente. Nós já estamos lá. Acho que é preciso fazer uma discussão mais ampla com sociedade, para buscarmos a essência do problema. Hoje as mulheres continuam tendo dois papéis, embora o homem já esteja sendo parceiro dentro de casa e na criação dos filhos.
Como a senhora conseguiu desenvolver sua carreira e se ajustar nesses papéis?
Helena: Eu tive um marido excepcional, que dividiu tudo comigo muito bem. Ele também era pesquisador, um médico. Quando eu estava com a minha filha, minha atenção era dela. Mas ela estudava em período integral e não é todo mundo que pode fazer isso. Eu não queria que ela ficasse com babá e TV. Nosso relacionamento é incrível. Algumas decisões são de foro íntimo e algumas pessoas não teriam a tranquilidade que eu tive em assumi-las. A mulher é criada dentro de uma filosofia de que é ela quem tem de fazer determinadas coisas.
 A senhora recebeu muito estímulo dos seus pais para ter uma carreira consolidada?
Helena: Minha mãe só terminou o ensino básico, mas eu brinco que ela fez o curso superior comigo e com a minha irmã, porque ela sempre nos estimulou muito. Meu pai a mesma coisa. Aliás, devo ao meu pai o fato de ter continuado meu curso. Eu havia tentado uma vaga em medicina na USP e não consegui. Fui aprovada em ciências biomédicas, mas era um curso muito novo e fiquei em dúvida. Meu pai me incentivou a começar e ver o que achava. Um homem sábio, porque me apaixonei pelas aulas, pelo laboratório. Se eu tivesse que repetir a minha vida, faria tudo de novo, igualzinho. A profissão de ensinar é uma enorme responsabilidade, mas o prazer de pesquisar é único.



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