Homens e mulheres usam sites especializados para engatar casos com desconhecidos, sem deixar marcas de batom no colarinho. Conheça as histórias de Ana e Gustav.
Não foi uma atração incontrolável nem fruto de uma bebedeira. Não foi com um colega de trabalho nem com um velho amigo. Diferente dos clichês de infidelidade, Ana planejou trair seu marido mesmo antes de conhecer um amante. O objetivo era sair da rotina e sentir novamente o frio na barriga que o casamento de sete anos não provocava mais. Em vez de paquerar em um bar ou balada, ela buscou a coragem que precisava na internet. E sem revelar a identidade ou o rosto, fez um perfil em um site voltado para infidelidade, onde dizia: “sou romântica”.
Mesmo sem mencionar sexo entre suas intenções, Ana, que tem 37 anos, foi rapidamente acionada por um pretendente. Algumas mensagens e um jantar separavam o mundo virtual de um caso real com um homem nove anos mais velho que ela e também casado. “Nunca tinha traído, tenho muita preocupação com minha imagem”, conta. Eles se encontram pelo menos uma vez a cada 15 dias e moram em cidades diferentes, a 100km de distância. Para manter a proximidade e eliminar rastros, conversam diariamente pela internet e pelo site: sem salvar históricos nem usar sobrenomes. “Ele tem o mesmo receio que eu quanto ao casamento, me sinto mais protegida assim”, explica.
A busca de amantes ou casos pela internet não é uma ideia nova, mas está ganhando formas mais elaboradas. Como Ana, internautas casados estão descobrindo sites específicos para traição, que reúnem pessoas comprometidas em busca de uma relação paralela, seja uma conversa virtual ou um encontro presencial. Assim funcionam o Second Love, o The Ohhtel e o Ashley Madison. Recém-chegados ao Brasil, eles já anunciam números altos de usuários e apostam no perfil do brasileiro para o serviço, principalmente nas grandes cidades. “O Brasil é o país mais infiel da América Latina. Só em São Paulo tivemos o lançamento de maior sucesso em capitais, comparando inclusive a Londres e Nova York, com mais de 53 mil visitas nos primeiros dez dias”, avalia a diretora do Ashley Madison Brasil, Jas Kaur. O concorrente, The Ohhtel, diz já ter 260 mil usuários desde que foi lançado, em julho, sendo 67 mil deles de São Paulo. Apesar de o número de cadastrados não refletir necessariamente potenciais traidores – muitos são apenas curiosos –, ainda assim o volume é expressivo para o período.
Gustavo usava salas de bate-papo desde 1995 para flertar fora do casamento. Com quase 40 anos, agora ele incluiu os sites especializados em traição na sua abordagem. “O objetivo principal é conhecer mulheres interessantes e conversar. Se acontecer algo mais é consequência”, justifica. A vantagem da internet, para ele, é a sensação de segurança e a abertura para falar de qualquer assunto: “em algumas horas de conversa você sabe mais e tem mais intimidade do que, talvez, em meses de conversa pessoalmente”.
Carioca, ele nunca paquerou na praia, entre mulheres de biquíni, nem no bairro onde mora. “Minha vizinha pode ser a Luana Piovani que eu não vou fazer isso, seria falta de respeito, não iria expor minha mulher”, explica ele, que acredita no ditado “o que os olhos não veem, o coração não sente”. Mas admite: “qualquer mulher inteligente, como é o caso dela, sabe que o marido não é santo”. Traição pior, na opinião dele, é a emocional, não a física.
“Recomendamos sempre que as pessoas tenham casos rápidos, sem envolvimento, e procurem outros usuários também casados, que tenham a mesma coisa a perder”, explica Jas. A ideia dos sites é preservar os casamentos e, para isso, ela ressalta a importância de não compartilhar números de telefone, e-mails e endereços – tudo para evitar ligações na madrugada, falsas expectativas de um amante e problemas conjugais futuros.
O Ashley Madison Brasil está apostando na receptividade de usuários das grandes cidades, como São Paulo e Rio de Janeiro
Não é só pelo sexo
O carioca Gustavo diz que só fez sexo com 10% das pessoas que conheceu na internet, somando cerca de 20 “amizades coloridas”, como ele mesmo gosta de definir. “Tem gente que já marca de encontrar direto no motel, não é meu caso”, diz. Ana concorda: “Não é só pelo sexo. Isso a gente já tem no casamento. É pela história, pela ansiedade de se ver. E tem sexo também”, explica. Um levantamento do The Ohhtel confirma esse comportamento: somente 18% das brasileiras inscritas disseram não ter mais intimidade com seu parceiro na cama. “Homens e mulheres querem atenção e sexo. Para eles, atributos físicos são importantes, e elas querem alguém que possa conversar além de ir pra cama”, avalia Jas.
Traidores online não são infelizes no casamento, necessariamente. Gustavo diz que é casado “com a mulher perfeita” e que “até a sogra é gente boa”. Ana, por sua vez, não pensa em largar o parceiro fixo. Por isso mesmo os dois se preocupam com discrição e anonimato. “Eu e essa outra pessoa falamos sobre os problemas dos nossos casamentos e deixamos frisado que amamos os companheiros e não queremos deixá-los”, explica Ana. E o quanto o caso extraconjugal vai durar? “Até que não seja mais emocionante”, diz ela.
Gustavo quer mesmo é variedade. “Meu lance é conhecer gente nova. Tenho fixação pelo prazer feminino. Acho que os homens têm um instinto muito forte. Alguns resolvem bem, sem magoar ninguém nem brincar com sentimentos, ou tem aqueles que dão em cima da vizinha, da cunhada. Em uma situação hipotética, qual a atitude menos pior que o marido ou namorado pode tomar?”. Os sites querem ser essa solução intermediária: “As pessoas têm a escolha de ficar infeliz no relacionamento, de jogar tudo para o alto ou ir atrás do que desejam sem mexer no casamento”, aponta Jas. Segundo ela, um caso passageiro ajuda algumas pessoas a valorizar o casamento, depois que percebem que “a grama do vizinho não é mais verde”.
Mulheres traem por vingança ou curiosidade
Os homens levam a fama de grandes traidores, garanhões, e são em média 70% dos usuários dos sites de infidelidade. Mas uma pesquisa britânica contradiz a tendência: segundo o site Illicit Encounters, para cada marido há 3,5 esposas procurando um caso online. Elas também ficam ativas por mais tempo, por cerca de um ano, enquanto os homens mantêm os perfis virtuais por cerca de seis meses.
Aqui no Brasil, os cadastros femininos são minoria, cerca de 30% em todos os sites, mas Jas vê um aumento potencial na participação delas, como aconteceu em outros países. Na Austrália e Espanha elas já são 40% e 35%, respectivamente, dos usuários do Ashley Madison. Sobre a diferença entre traidores homens e mulheres, a executiva avalia: “homens falam mais sobre a traição, contam para o outro cara e muitas vezes a mulher não conta nem pra melhor amiga. Traem mais por uma vontade delas que para exibir”.
“ Não é só pelo sexo. Isso a gente já tem no casamento
Qual seria então a motivação para trair? As usuárias do Ashley Madison, em média com 33 anos de idade e casadas há mais de sete anos, dizem que traem por curiosidade e vingança – a maioria foi traída em algum momento por seus parceiros. “As pessoas estão lá porque falta algo no relacionamento. A mulher quer atenção, ser paparicada. Quando o homem para de fazer essas coisas, ela pensa se ele tem outra ou fica insegura”, avalia Jas.
Onde começa a traição?
Fazer um perfil no site nem sempre resulta em sexo fora do casamento. Há espaço para envio de mensagens apenas, troca de fotos e paquera. Alguns entram para se aclimatar e pensar na possibilidade de traição. Outros, como Gustavo, querem mesmo é encontrar alguém ao vivo. Mas, quem entra no site de traição já é um traidor? Jas acredita que sim. “Já está no caminho, já tem curiosidade. 78% dos usuários no mundo disseram que foram a encontros”, diz. Para Ailton Amélio, psicólogo e livros sobre relacionamentos, não é o ato flertar na internet que caracteriza enganar o parceiro, mas as pequenas traições podem abrir caminho para outras maiores: “conhece só na web, depois quer tomar só um café, aí acha a pessoa legal e vai levando adiante”, aponta
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