segunda-feira, 5 de março de 2012

Sexo na terceira idade

Para elas é difícil falar de preservativo com seus parceiros

Roberto Carlos na vitrola embalava o casal que dançava agarradinho para comemorar os três meses de namoro. Fazendo pose de romântico, Nelson colocou um doce na boca de Zilda. “Nel-son!”, disse ela com voz de brava. “Essa bala que você me deu está com papel”, reclamou. Sem rodeio, o parceiro justificou a travessura. “Então, meu amor, é assim que eu me sinto quando você me obriga a transar de camisinha.”

A história (verídica) acima foi vivida por Zilda de Souza Pereira, 69 anos. Ela tinha 61 na época e ainda era novata na história de relacionamento na terceira idade. Já aposentada, tinha ouvido do médico que preservativo era fundamental para saúde. Não imaginava que iria enfrentar tanta resistência do companheiro.

“Bati o pé e exigi a proteção. Hoje, estamos juntos há oito anos e, vou confessar, não usamos mais camisinha. Mas fazemos exames sempre, de seis em seis meses”, garante.

O Nelson está hoje com 76 anos e Zilda 69. “Minhas amigas, que têm a mesma idade do que eu, falam que quanto mais velho o homem, mais difícil é usar camisinha. Eles, e elas, não gostam mesmo, um perigo.”

Mais novos e mais velhos

Foto: Eduardo Iezzi/Fotoarena Ampliar
Zilda, 69 anos, não descuida da saúde no namoro
Torcer o nariz para a prevenção sexual é o típico comportamento de risco que faz com que alguns grupos ganhem evidência nos dados de aids do Brasil. E essa postura, dizem os especialistas, é adotada tanto pelas pessoas mais velhas – com mais de 60 anos – quanto pelos mais novos (com menos de 15). Não é à toa que os dois extremos de idade são crescentes nas estatísticas da doença e viraram alvo de campanhas específicas do Ministério da Saúde. As com mais de 50 hoje são 15% entre os novos casos e não passavam de 8% em 2000. Entre as garotas, são dez infectadas para cada oito meninos. Há uma década, a incidência era de dez moças para 15 rapazes.

Uma das hipóteses para os idosos e adolescentes não fazerem da camisinha um companhia constante das relações sexuais é que as duas faixas etárias não viveram de perto os anos mais tensos da epidemia de transmissão do HIV, na década de 80. Na época, o diagnóstico era uma sentença de morte, não havia remédios eficientes e nem perspectiva de vida normal. Os avanços da medicina fizeram uma mudança no prognóstico, mas ainda são 30 mil infectados todo ano no Brasil.

No grupo dos idosos, o principal perfil de infecção é de heterossexuais, com relacionamento fixo, conforme mostrou estudo da Universidade Federal do Ceará. Uma enquete feita pelo Instituto de Infectologia Emílio Ribas mostrou como os contágios em geral acontecem: 75% das mulheres portadoras do vírus com mais de 60 anos foram infectadas por seus maridos. Já entre os homens, 80% afirmam terem contraído a doença em relações extraconjugais e infectado suas parceiras. O levantamento foi feito com 100 pacientes do ambulatório do idoso da unidade, referência nacional do País.

Mocinhas e senhoras

A resistência em usar camisinha não é a única semelhança entre moças e senhoras. A médica ginecologista Albertina Duarte Takeuti, responsável pelo Programa de Saúde do Adolescente de São Paulo, define que as meninas têm dificuldade em negociar o preservativo com os parceiros, com medo de desagradar os namorados. Mesma queixa aparece entre as senhoras, conta Maria Filomena Cernicchiaro, responsável pelo grupo da terceira idade do Centro de Referência e Treinamento em Aids.

“Nada diferente das preocupações dos adolescentes. Primeiro porque é muita disputa, são bem mais mulheres do que homens nessa idade. Elas, com medo de perder o parceiro, acabam não falando de camisinha”, diz. Outra dificuldade é que tanto os homens mais velhos quanto os mais novos temem muito falhar na “hora h”. O preservativo, colocado sem experiência, pode dificultar a ereção.

No caso das senhoras, principalmente, outro problema que pode afastar a camisinha é a falta de lubrificação vaginal. O preservativo pode machucar. “Elas podem sentir que machuca e uma das possíveis soluções é a camisinha feminina”, afirma Maria Filomena.

Dona Zilda vive falando para as amigas que é preciso usar a camisinha, não pode esquecer, nem cair na história do “chupar bala com papel”. “Adoro a minha vida, gosto muito de mim para querer ficar doente”, diz ela retocando batom, antes de ir para a sala de ginástica, local preferido para falar com as amigas de medos, anseios e também de sexo.

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