quinta-feira, 27 de junho de 2013

Aniversariante ou popstar?

Comemorar aniversário infantil em limusines ou em salões de beleza desloca o sentido da celebração para uma mera demonstração de poder material



Foto: Getty ImagesAmpliar
Aniversário infantil: preservar o verdadeiro sentido da comemoração não significa gastar tudo em festas de luxo
Crianças comemorando o aniversário em Paris, desfilando pela cidade em uma limusine ou vivendo um dia de celebridade em uma clínica de estética. Meninos e meninas tratados como estrelas de festas cheias de pompa em luxuosos buffets infantis ou em famosos templos de lazer e recreação. Estes exageros ao alcance de uma pequena parcela da população infantil desvirtuam o verdadeiro sentido de uma data importante que marca a nossa vida social: o dia do nascimento. Noticiados pela mídia, surgem como modelo de cultura na qual um momento especial de manifestações de carinho e afeto passa a ser tratado como demonstração de poder material.

Conversei com psicólogos que compartilham a ideia de que devemos preservar o verdadeiro sentido das comemorações. Para as crianças, os preparativos do aniversário e a festinha são percebidos de acordo o desenvolvimento de cada uma, dando sinais da passagem do tempo e contribuindo para a construção da identidade e para o ingresso no mundo social. Já o exibicionismo desejado e patrocinado pelos pais pode esvaziar o papel simbólico da data como referência social na infância. 

Para o professor Lino de Macedo, do Departamento da Aprendizagem, do Desenvolvimento e da Personalidade da Universidade de São Paulo (USP), comemorar é fundamental para as crianças. “É importante, sim. As atenções estão voltadas para a criança, sim. Mas não deve ser motivo de ostentação, de arrogância, de prova material de que ela pode tudo, de que ela tem tudo. Acho lamentável esse tratamento de mídia, é uma coisa deseducativa”.

Lino de Macedo disse que colocar meninos e meninas na posição de popstar estimula a competição, pois cada um quer ter a melhor festa, a melhor roupa e ganhar o maior número de presentes e de aplausos. A exposição também pode ser um desafio pesado demais, pois eles não têm recursos emocionais para compreender o inusitado daquele momento e voltar para o dia a dia como apenas mais uma criança entre tantas. Alguns podem permanecer na fantasia de que tudo é permitido ou se confundir com os pais. Afinal, enquanto os adultos têm dinheiro, a criança ainda precisa construir a própria vida. “Nos dias seguintes, ela pode exigir um tratamento de popstar. Ela vai correr atrás de como fazer para manter isso. Tem criança muito vaidosa e é preciso baixar a bola dela”.

Por outro lado, o professor acredita que o dia não deve ser menosprezado, pois tem um valor simbólico e educativo muito grande. O aniversário, como as festas de final de ano, são ritos de passagem. “Os dois extremos são muito ruins. Não se deve tratar como um grande acontecimento. Mas, na nossa cultura, a data do nascimento é importante, não é um dia qualquer. É uma oportunidade de encontro saudável com amigos. Mesmo famílias pobres fazem festa. A criança ser esquecida é ruim”.

Para o psicanalista comportamental Florival Scheroki, comemorar também é importante porque a cronologia é marcada por eventos que servem de referência para as nossas lembranças. Segundo ele, com o passar dos anos, a criança percebe que o aniversário está relacionado ao crescimento dela e, enquanto é bem pequenininha, a comemoração tem valor simbólico para os pais. “O papel é muito mais para os adultos. É uma demonstração de amor dos pais para com os filhos. Quase sempre é verdadeiro”.

A comemoração contribui para a socialização da criança, que experimenta papéis no jogo social. O psicanalista acha que os exageros são resultado do exibicionismo dos pais, que criam uma “caricatura de semideus para o filho”. Eles provavelmente refletem a maneira como a criança é tratada no dia a dia. “A criança precisa da diversidade de relacionamentos e de objetos, não do exibicionismo. Elas querem a festa, a reunião. Toda situação de vida em que a criança recebe gestos ou palavras de afeto mexe com a autoestima e é importante”.

Nenhum comentário:

Postar um comentário