Proteger os filhos é oferecer as condições para que eles façam as coisas, superproteger é impedir que eles aprendam a fazê-las
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Superproteção: manter os filhos sob cuidado extremo pode significar despreparo da mãe
Gostei do que disse o psicanalista durante uma sessão de terapia quando se falava da necessidade de uma criança pelos cuidados e pela presença da mãe nos primeiros anos de vida: “Falta de mãe é um problema, excesso é pior ainda!” Parti dessa frase para conversar e refletir sobre a diferença entre uma mãe que protege e uma que superprotege, entre uma mãe cuidadosa e dedicada e uma supermãe.
Quando a sociedade moderna discute o papel da mulher, é bom saber: o zelo desmedido pode deformar mais o ser humano do que a ausência materna. Afinal, para dar conta de filhos, vida profissional, conjugal, social e afazeres domésticos, reduzimos o tempo de permanência com as crianças.
A chance de uma pessoa gozar de boa saúde mental é maior se cresceu experimentando desafios de acordo com as suas possibilidades do que se passou a vida sufocada por um excesso de proteção, sem colocar o nariz para fora do cerco criado em torno dela.
E quem não conhece uma supermãe? Para a psicóloga e psicanalista Marcia Porto Ferreira, do Departamento de Psicanálise da Criança do Instituto Sedes Sapientiae, a frase é “perfeita” porque o excesso de mãe não permite ao indivíduo “ir para o mundo”, enquanto a falta pode ser suprida por outras pessoas, como uma avó, uma babá ou uma professora. Segundo ela, a psicanálise aposta na busca da criança por substitutos quando a mãe não está presente.
Marcia disse que a mãe extremamente embevecida com o resultado da sua produção se apropria do filho com tamanha voracidade que não permite à criança buscar nada além dela. Todos nós somos incompletos e saímos em busca de complementações parciais nas relações amorosas desenvolvidas ao longo da vida. Por isso, podem ser graves os quadros de saúde mental quando o filho é convencido a permanecer ligado emocionalmente à mãe, pois vive a ilusão de que ela o completa por inteiro.
Para o psicólogo e psicanalista Rubens Maciel, pesquisador do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), a supermãe pode ser uma mulher emocionalmente imatura que transforma a angústia extrema diante do filho em excesso de zelo. Sem saber lidar com os afetos, ela se comporta como uma executiva capaz de cuidar de tudo direitinho, mas, por incapacidade de vínculo, cumpre o papel de maneira exagerada, com uma dupla mensagem: “enquanto um braço abraça, o outro braço empurra o peito da criança.”
Rubens apontou motivos diversos para uma mulher adotar a postura de supermãe. Ela pode, por exemplo, ter dificuldade de desligar-se de um filho que representa o seu único vínculo afetivo. Em casos assim, a mãe toma a criança como objeto de posse e faz tudo para ela não crescer, para sempre depender dela em alguma medida.
A supermãe também pode revelar uma mulher despreparada para a vida, que não elaborou bem pensamentos e sentimentos quando se deparou com eles. Não conseguindo realizar as coisas como almeja, projeta isso no filho e supõe que ele também não terá condições de enfrentar a vida. Essa mãe cobre a criança de proteção, achando que o filho vai morrer de medo de tudo o que tiver de encarar pela frente.
Olhando em volta, não é difícil perceber o quanto é mais saudável criar os filhos para mundo, encorajá-los a experimentar as novidades e a enfrentar as dificuldades. Proteger é oferecer as condições para que eles façam as coisas, superproteger é impedir que eles aprendam a fazer sozinhos.
Infelizmente, ainda há quem acredite que a mulher deve ser uma supermãe, fazer tudo pelo filho e colocá-lo à frente e acima de qualquer desejo ou compromisso para protegê-lo de todos os riscos, privações e frustrações. Ledo engano!
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