Panfletos eletrônicos em redes sociais enaltecem a mulher “para casar” em detrimento das que são “só para transar”
Piriguete no dicionário: "moça ou mulher que, não tendo namorado, demonstra interesse por qualquer um"Tem pipocado na internet nos últimos meses, especialmente nas redes sociais como Facebook e Twitter, uma série de postagens aparentemente fora de seu tempo. Por meio de panfletos e montagens, as mulheres são divididas em dois grupos: as “de verdade” são dóceis, boas para casar e nem sempre estão disponíveis para o sexo – talvez eles cobrem o oposto depois do casamento. Na outra ponta estão as “piriguetes” ou “biscates”, que não freiam o próprio desejo sexual e transam com facilidade. Não há meio-termo.
Popozudas com minissaias, assistentes de palco exuberantes e garotas que “descem até o chão” na pista de dança estão entre os alvos dos panfletos eletrônicos. As moças namoráveis são representadas por jovens bonitas e discretas, a típica “gatinha” – pense em Sandy e Grazi Massafera.
Engana-se, porém, quem relaciona essa onda unicamente a marmanjos machistas. Entre os que postam e “curtem” estão muitas mulheres, inclusive jovens, que na maioria das vezes consideram tais atitudes e modos vergonhosos e depreciativos para a imagem feminina.
Mas se vivemos em tempos de culto ao corpo e sexo casual praticado livremente, por que ainda guardamos tanto moralismos? De certa forma, essa dualidade de esconde e mostra na sexualidade é um retrato da sociedade brasileira, como relata o sociólogo e filósofo Paulo Sérgio do Carmo no livro recém-lançado “Entre a Luxúria e o Pudor: A História do Sexo no Brasil” (Editora Octavo). “Um país católico como o nosso, com a igreja fiscalizando o tempo topo, fica entre esses dois pólos: luxuria e pudor. Por causa do Carnaval, o Brasil é tido como paraíso sexual pelos estrangeiros, mas é na verdade altamente conservador”, ressalta.
Piriguete no dicionário: "moça ou mulher que, não tendo namorado, demonstra interesse por qualquer um"
Para a historiadora Mary Del Priori, a abordagem do sexo de forma banalizada tende a desencadear julgamentos e reações de diversos tipos, inclusive as preconceituosas. “Só se fala nisso, e fala-se mal”, constata a autora do livro “Histórias Íntimas” (Editora Planeta), que trata da evolução do erotismo no Brasil desde o período colonial. Para muitos jovens, ela diz, o excesso do tema provoca nostalgia. “A liberdade sexual pode ser um fardo”.
A divisão das mulheres em dois grupos é recorrente em nossas terras tropicais. “A prática de separar ‘certas’ e ‘erradas’ é muito antiga, mas ficou mais visível nos anos 50”, esclarece Mary sobre os chamados Anos Dourados. “Ditados populares reforçavam a crença de que as mulheres muito dadas acabavam sem atrativos nem mistérios”. Carmo completa e puxa na memória um exemplo típico dos anos 70: “Um colega alertava o outro se uma moça já tinha sido noiva, dado alguma liberdade”, conta. E só se passaram pouco mais de 40 anos.
A feminista Bia Cardoso, que mantêm ao lado de diversas amigas o Blogueiras Feministas, faz sua análise sobre a campanha contra as supostas “piriguetes”. “Não existe ‘se expor demais’, senão estamos automaticamente aceitando que é preciso controlar a sexualidade das mulheres”, diz.
Rindo do preconceito
O perfil @tiposdebiscat no Twitter, criado pelos publicitários Leonardo Polo de Aquino, 22 anos, e Pierre Artistta, 25 anos, joga um pouco de humor sobre as moças rechaçadas. “Biscat que usa vestido tomara-que-caia, sutiã tomara-que-segure, calcinha tomara-que-tirem e salto tomara-que-não-quebre-minha-perna”, brinca uma das mensagens da dupla.
Imagem de protesto em São Paulo
Imagem de protesto em São Paulo
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