Como evitar os cuidados exagerados com os filhos adultos e deixar a convivência no lar mais harmoniosa
Regina Estela Cardoso e seus filhos, Roberta, de 32, e Rodrigo, de 29: diálogo é importante para estabelecer limites
Todos os dias, a dona de casa Regina Estela Cardoso, de 60 anos, é a primeira a se levantar. Ela prepara o café da manhã, arruma a mesa com tudo o que os filhos gostam e sai para a academia. Já adultos, o bancário Rodrigo, de 29 anos, e a professora Roberta, de 32, ainda moram com ela - e recebem da mãe todos os mimos possíveis.
Nada contra os mimos, mas para morar com filhos já adultos é preciso que exista um conjunto de regras que devem ser respeitadas por todos os membros da família, segundo afirma a psicóloga comportamental Paula Pessoa Carvalho. “O que acontece é os filhos adultos têm a casa dos pais como deles também. Por isso, é necessário ter um diálogo para estabelecer os limites dos espaços ocupados pelos filhos”, diz a profissional.
No caso de Regina, ela conta que os filhos são organizados e estudiosos, mas não colaboram muito com as tarefas da casa. É ela quem faz praticamente tudo: desde preparar a comida até lavar e passar as roupas dos filhos. “Eles são independentes, não têm de dar satisfação, mas, no fim, ainda dependem da gente pra tudo”, diz a mãe.
Regina diz que faz tudo com prazer, embora admita que, em muitos casos, deixa de realizar as próprias atividades para cuidar do que os filhos precisam. “Eu faço tudo por eles: se precisa ir ao banco pagar uma conta, eu vou, se precisa levar uma roupa no tintureiro, eu vou. Já teve vezes que tive que sair no meio da minha aula de artesanato para fazer algo por eles. Mas não fico chateada, faço tudo numa boa”.
O fenômeno da adolescência prolongada
De acordo com a psicoterapeuta Angela Maria Carcassoli Kato, o que tem acontecido é que muitas famílias estão “alongando” a fase da adolescência dos filhos. “Pessoas com mais de 25 anos ainda estão vivendo com os pais como adolescentes. É certo que muitas delas ainda estão estudando, mas outros serão eternamente alunos e nunca adultos responsáveis por si próprios”, declara.
Ela diz que, quando isso acontece, há dois lados a observar: o comodismo dos filhos, que têm tudo fácil em casa, e a proteção exagerada dos pais, que gostam que os descendentes continuem por perto. “Isso geralmente acontece com mães que têm como função principal serem mães. e, por isso, têm dificuldade maior para abrir mão deste papel. Filhos adultos pressupõem mães que conseguem vê-los como seres autônomos e independentes.
O lado ruim de cuidar excessivamente dos filhos já adultos é que, por conta disso, muitas mães retardam o amadurecimento deles. Dona Regina reconhece que, ao se dedicar tanto aos filhos, acaba interferindo no processo de independência deles. “Sei que tenho culpa, porque mimei demais”, diz.
Já a designer gráfico Flória Napoli, de 62 anos, afirma que, embora faça tudo pela filha Giovana Peres, de 23, não teme que a jovem fique dependente dela. “Ano passado, ela morou nos Estados Unidos, e foi bom para ela amadurecer e aprender a se virar. Ela sabe cuidar da casa, se precisar”, diz.
Apesar disso, Flória é quem faz tudo em casa. Como a jovem é vegetariana, a comida dela é preparada separadamente. Quando acorda, Giovana já tem o almoço pronto e vai de carona com a mãe para o trabalho. À noite, Flória ainda limpa a casa, lava e passa as roupas e prepara uma sopa para a filha comer quando voltar da faculdade, por volta das 23 horas. “Sei que paparico muito, mas fico preocupada porque ela é muito ocupada e tem uma saúde mais debilitada. Então, faço questão que ela coma bem”, diz a mãe.
Os pais devem incentivar a independência
O mercado de trabalho pode estar exigindo dos jovens um tempo maior de formação acadêmica. Mestrados, especializações, intercâmbios, estágios consomem tempo e dinheiro e viver na casa dos pais pode ajudar a viabilizar uma boa posição profissional. Eventualmente, também podem obrigar os jovens e fazerem jornadas duplas entre trabalho e estudo. No entanto, apesar de ainda estudarem e trabalharem duro, os pais devem, sim, incentivá-los a terem mais autonomia e autoconfiança para “andarem com as próprias pernas”, segundo afirma a psicoterapeuta Angela Kato. A melhor formação acadêmica e profissional não vai adiantar muito se o seu filho não se sentir confiante para sair do ninho e lançar-se no mundo.
Uma forma simples de fazer isto é simplesmente sentar em volta da mesa e pedir que os filhos colaborem com as tarefas domésticas ou com as despesas da casa. “É preciso que eles percebam que ali não é o paraíso, onde tudo vem magicamente”, diz Angela. Nestes casos, pode-se deixar combinado que todo mês o filho deverá pagar uma conta, como a de telefone ou de internet por exemplo, ou, se não tiver como colaborar financeiramente, ajudar nos afazeres diários, como arrumar a própria cama e lavar a louça do jantar.
É claro que, no dia a dia, a família deve ser pautada pelo bom senso. Não precisa deixar de mimar. Mas mimos são carinhos, não obrigação da mãe. Portanto, levar um leite quentinho para o filho que está adoentado, é válido. Levar leite na cama para ele todos os dias, não. “Os pais devem incentivar os filhos a terem uma vida independente, de forma que eles sejam para os filhos sempre um ‘porto seguro’, mas não seus mantenedores”, conclui a psicóloga comportamental Paula Pessoa Carvalho
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