RIO - Tem foto de fruta na embalagem, cor de fruta, sabor de fruta, mas não tem fruta. Essa foi a constatação do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) em relação a oito dos 18 produtos alimentícios industrializados avaliados em sua última pesquisa. A análise levou em consideração se os apelos relacionados a frutas nos rótulos estão condizentes com o conteúdo. E revelou ainda que a situação entre os dez produtos, que de fato têm frutas na sua composição, não é muito melhor do que a dos demais: metade não informa o percentual de polpa e dos cinco que o declararam a variação fica entre 1% e 10% dos ingredientes.
— É difícil para o consumidor leigo entender que o produto tem sabor de morango, mas não tem morango. E ao usar com grande destaque imagens de fruta na embalagem as empresas estão induzindo o consumidor a achar que está comprando um produto mais natural e saudável, o que nem sempre é verdade. Muitos têm excesso de açúcar e aditivos químicos justamente para imitar o sabor da fruta — destaca Sílvia Vignola, consultora técnica do Idec.
Para o levantamento, o Idec analisou embalagens de três fabricantes, em cada uma das seis categorias de produtos. No grupo dos iogurtes, foram avaliados Batavo Kissy morango, Lego Light Lective e Danoninho. No de refrescos em pó, Tang, La Frutta e Camp. Entre os isotônicos, Gatorade, Taeq e Marathon. Na classificação néctar de fruta, a pesquisa incluiu Top Fruit, Maguary e Del Valle-Kapo. Na categoria gelatina, Frutop, Dr. Oetker e Royal. E na de sorvetes, o sabor napolitano da Sorveteria Kidelícia de Sabor, da Nestlé, além do Kibon Balance.
Para Antônio Augusto Fonseca Garcia, nutricionista e coordenador da unidade técnica do Conselho Federal de Nutricionistas (CFN), o que a indústria faz ao usar e a abusar da imagem das frutas como chamariz em suas embalagens é propaganda enganosa:
— Há um apelo por uma alimentação mais saudável hoje em dia e as pessoas ao verem as imagens do rótulo são levadas a subliminarmente acreditar que estão comendo fruta. No entanto, os percentuais de polpa costumam ser insignificantes, a quantidade de açúcar muitas vezes é maior do que a dos refrigerantes. No fim do dia, quem consome muitos produtos industrializados pode, inclusive acabar ultrapassando o percentual máximo de aditivos químicos recomendados pela FAO — diz o nutricionista.
Luciana Pellegrino, presidente da Associação Brasileira de Embalagem (Abre), admite que o uso de fruta na embalagem confere uma conotação mais saudável ao produto, mas pondera que o recurso também é usado para facilitar a identificação do sabor do alimento. Ela destaca que a indústria segue as normas legais e que o segmento não pode criar suas próprias regras. Eventuais mudanças, diz Luciana, têm que ser discutidas com o poder público e o consumidor.
O Idec e o Conselho Federal de Nutricionista defendem, no entanto, mudanças imediatas independentemente da alteração das normas vigentes. Eles propõem informação mais clara ao consumidor, o que inclui além da divulgação do percentual de fruta dos produtos, a proibição do uso desproporcional ao conteúdo das imagens de frutas nas embalagens.
— Existe uma lacuna na legislação, já que ela não prevê a divulgação do percentual de fruta na composição. Mas as empresas podem e devem ir além da regulação, para benefício do consumidor. Além disso, já há leis, como o Código de Defesa do Consumidor (CDC), que obrigam a informação clara e ostensiva ao consumidor. É preciso melhorar as regras, mas é fundamental aumentar a fiscalização, o que já seria suficiente para implementar mudanças.
Em enquete realizada pelo Idec, com internautas, aponta que 62% consideram difícil saber se há presença de frutas no alimento e que gostariam que houvesse uma regulamentação que obrigasse às empresas a informar o percentual na composição de seus produtos. Outros 25% defendem a mudança na regra para evitar propaganda enganosa.
A coordenadora técnica do Idec, que há 30 anos se dedica ao segmento, afirma que até mesmo para ela, algumas vezes, é difícil retirar o máximo de informação dos rótulos. Sílvia explica, no entanto, que há alguns macetes que podem ajudar a “leitura” das embalagens:
— Na listagem de ingredientes, por exemplo, os produtos aparecem em ordem decrescente. Ou seja, o primeiro da lista é sempre aquele que está em maior quantidade na composição. Outra informação que a maioria dos consumidores desconhecem é a diferença da definição entre suco, néctar e refresco. O primeiro é 100% fruta, o chamado néctar concentra de 30% a 40% de concentração, já os refrescos de 20% a 30% — explica Sílvia.
As empresas foram procuradas pela reportagem e a Unilever, a Danone e a BRF Foods informaram que seus produtos atendem todas as normas vigentes no país. A KraftFoods, a Ebba e a Vigor disseram que as informações que constam da pesquisa foram fornecidas pelas empresas ao Idec. O Grupo Pão de Açucar informou que embora os produtos Taeq atendam às determinações da Anvisa quanto à rotulagem, vai analisar os pontos abordados pelo Idec quanto a uma possível reformulação dos rótulos.
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