sexta-feira, 6 de abril de 2012

Sacrifícios na Semana Santa


Fazer jejum parece coisa do passado? Saiba por que jejuar faz parte da vida espiritual dos homens e leia depoimentos de quem jejua
Sexta-feira Santa não se come carne. (Quase) todo mundo sabe disso. Nem todo mundo, no entanto, se lembra das razões. E, caso lembre, associa jejum e abstinência com ‘coisas do tempo das avós’ e não pensa mais no assunto.
Os jejuns, no entanto, sempre fizeram parte da experiência espiritual dos homens. Tradicionalmente, numa situação de privação voluntária de alimento estamos decidindo enfrentar, consciente e deliberadamente, o mais agudo dos nossos medos, o medo da fome, o medo da morte.
Comer é algo tão vital para os seres vivos que mesmo o jejum mais leve exige uma grande dose de força de vontade e, por isso, jejuar acabou sendo o exercício mais perfeito para treinar a disciplina, o domínio de si, o desprendimento e a valentia dos humanos desde os tempos mais primitivos.
Para os cristãos, o jejum, junto com a prática da caridade e a dedicação às orações, é parte do espírito da Quaresma, aqueles 40 dias que separam a Quarta-feira de Cinzas da Sexta-feira Santa. Simbolicamente, esses dias estão associados ao tempo que Jesus passou jejuando no deserto, antes de voltar para Jerusalém e cumprir seu destino de morrer na cruz e ressuscitar e são esses os grandes temas das orações e rituais da Quaresma.
Todas as festas e celebrações da Semana Santa falam desse evento, a morte e a ressurreição de Jesus Cristo, que é a espinha dorsal da fé cristã.
Andréa Amaral, de 29 anos, resolveu aderir ao espírito da Quaresma e se abster durante o mês inteiro de sua paixão: chocolates. Para conseguir aguentar um mês inteiro longe dos chocolates, a publicitária, usa a vontade de emagrecer como motivação adicional. Além de abrir mão do chocolate, ela deixa de comer tudo que engorde muito. “Você aproveita para começar uma dieta também, aí acaba não sentindo muito a falta do chocolate, pois está sentindo também a falta de outras comidas!”, conta.
Mas jejuar apenas não basta. Os aliados do jejum na disciplina espiritual são o recolhimento e a oração. São formas ancestrais de preparar o coração para os rituais e as cerimônias religiosas ou para as mudanças fundamentais da vida. Os reis, por exemplo, deviam passar por um período de jejum e de recolhimento antes de poderem ser coroados.
E assim como a oração, a abstenção de comida ou de alguns tipos de alimento ou da quantidade de alimento a ser ingerida é costume recorrente em todas as religiões. Judeus, islâmicos, budistas, hinduístas, cristãos, todos reservam um tempo no calendário religioso para praticar a abstinência ou a privação de alimento.
É como forma de agradecimento que o analista de sistemas Murilo Lima, 25, aderiu à prática pela primeira vez este ano. O sacrifício, em seu caso, foi deixar de comer carne vermelha, uma de suas paixões. “Alguns dias eu sofri por não poder comer tanto algo que gosto, mas até que foi tranquilo - apesar de estar contando os dias para poder comer um ‘steak’!”, brinca.
Murilo não precisava esperar tanto. Segundo as recomendações da Arquidiocese de São Paulo, o jejum durante a Quaresma deve ser feito apenas na Quarta-feira de Cinzas, em todas as sextas-feiras, e na Sexta-feira da Paixão. A Igreja recomenda um jejum que pode parecer leve, mas que ainda assim exige disciplina: você pode tomar café da manhã e almoçar por exemplo. Mas deve fazer apenas um lanche frugal à noite. Bebidas alcoólicas, doces e guloseimas estão proibidas. Na Sexta-feira Santa, em vez de jejuar, abstenha-se de carne.
No cardápio da bancária Renata Pinheiro, de 31 anos, peixe é a única carne permitida nos 40 dias de sacrifício. Ela conta que a principal dificuldade é que nem todas as pessoas de seu convívio social participam, o que faz com que ela tenha que encarar alguns desafios à provação. “Outro dia, por exemplo, fui a um churrasco com os amigos. Foi duro, mas resisti!”, garante.
Segundo Renata, com disciplina tudo é possível, mas é preciso estar preparado para lidar com algumas situações pouco confortáveis. “No restaurante sempre tem opções, mas, às vezes, quando você está na casa de algum amigo ou familiar não tem. Deixei de sair algumas vezes, mas isso não pode acontecer sempre”, aconselha.
Para quem ainda tem dúvidas se vale a pena aderir à disciplina do jejum, resta lembrar que depois de todo esforço de abstinência, os ovos de chocolate na celebração do Domingo de Páscoa vão estar ainda muito mais gostosos!

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